quarta-feira, 23 de abril de 2008

Cultura Perdida

Você percebe que há algo errado na língua portuguesa quando os termos traduzidos surtem o efeito inverso que deveriam ter.

_ Você precisa reiniciar o computador.
_ Como assim? Dar um boot?

E então quando você menos espera:

_ Então, espetei a bicha lá e nada cara!
_ Falta instalar os draiveres.
_ Po, tentei achar no gugou mas caí num treco lá que pedia um registro.
_ Eu acho que tenho no meu pen-draive, vou zipar e mandar pra você.
_ Aproveita e manda aquele link também.
_ Qual link?
_ O que tem aquele video que o cara dá uma fotoshipada na mulher.
_ Ah tá, é só procurar no ioutube, procura por foto-chóp.
_ Dá hora esse ioutube. Sabe quem eu achei no iorgut?
_ Quem?
_ As piriguetes de samambaia!

terça-feira, 22 de abril de 2008

O caso Isabella e o sofá perdido


O que o caso Isabella tem com esse blog? Eu diria que esse seria mais um caso sobre a era da Informação e os crimes hediondos.

A Era da Informação já é uma realidade, sinto muito, mas é. A Era de Informação praticamente exterminou mitos de sua era anterior. Nós matamos os lobisomens das fazendas, os filhos de boto do Pará e o Saci Pererê. Afinal de contas, o Saci hoje tem cotas em universidades e presta concurso público como deficiente. Trocamos todas as lendas pela violência urbana, exames de DNA, estatísticas de criminalidade e a culpa no Governo Federal.

O caso Isabella, na era anterior teria sido só mais um mito urbano. Se tivesse pego a época de ditadura já teria sido resolvido tão misteriosamente quanto suas atuais causas. Se fosse antes disso seria roteiro de filme para os tempos atuais, contadas no cochicho da vizinhança.

Hoje ele é quase uma novela em tempo real. Daqui a pouco eu saberei até quantas vezes o pai do Alexandre foi no banheiro. Sem contar com o clima de mistério, numa cidade do tamanho de São Paulo a mãe estava poucos metros da cena do crime, ela não chora em público, não comenta. A madrasta dá o tom final, lembrando antigos longas da Disney. A única testemunha fora os acusados são duas crianças, uma mal aprendeu a falar. Mas essa mesma novela mostra como a era da informação modificou o cenário do crime.

Os advogados de defesa não falam ao telefone com os acusados, eles têm que ir até o encontro de um deles. A primeira coisa que foi reclamada pela família do pai foi um cabo que poderia ser uma escuta, próximo a sua casa. Com certeza uma conversa comprometedora por celular logo estaria em todos os noticiários horas depois. Acabo de lembrar que a Era da Informação matou todos os videntes de fome, o Google está se encarregando do resto.

O juiz pediu sigilo, gerando ainda mais especulação sobre tudo. A lei então tomou forma, como um guru que tem opinião própria, tanto a defesa quanto a acusação tentam buscar na lei algo para modificar a acusação. Reuniões e mais reuniões sobre qual o próximo passo, quase uma partida de xadrez entre dois especialistas. Cada movimento milimetrado pela imprensa. Pobre dos envolvidos.

Seja qual for o resultado final desse caso ou o esquecimento do mesmo, o que me chamou a atenção não foi a barbárie, acostumado que sou com o cotidiano das grandes cidades, dos folhetins que escorrem sangue, mas sim o fato do suspeito ser o pai, assim como eu, da vítima ter a mesma idade que meu filho mais novo, da minha filha de 10 anos me perguntar o que está acontecendo e do nó em gota d'água que os advogados de defesa conseguem dar.

Qualquer pessoa normal chega em seu apartamento e se depara com um furo na tela e encontra algo seu de valor jogado no jardim, claro que a primeira atitude é ligar para o pai: "Pai, você não vai acreditar... jogaram meu sofá pela janela do apartamento". Quando você fosse questionado a resposta seria óbvia: "Costumo ligar para meu pai quando algo cai pela janela do meu apartamento" e resmungaria um "pergunta idiota".

Afinal de contas, vamos pelo simples final do crime... Se você chega ao térreo de um prédio e vê o seu cachorro jogado no jardim após uma queda de 20 metros, você não gritaria "tem um ladrão em meu apartamento", você só gritaria isso se fosse seu sofá. Você não chamaria o porteiro de "incompetente", só chamaria disso se fosse realmente seu sofá, o que faz pleno sentido, pois a obrigação do porteiro é segurar tudo que cai das janelas.

Sua mulher grita palavrões. Afinal um "vai tomar no cú" já é tão natural hoje em dia e o "foda-se" sempre torna o ambiente silencioso e pacífico, aprendemos isso no Youtube.

Então quando você fosse intimado a prestar depoimento sobre o sofá jogado no jardim, é claro que não diria nada sobre o ladrão, afinal de contas, foi só imaginação sua, momentânea. Por falar em depoimento, aparecem dezenas de testemunhas para dizer todas as vezes que você agrediu o sofá durante o jogo de futebol. Daquela vez que você derramou refrigerante e gritou "PQP!". Você negaria tudo, seu sofá e você tinha uma relação de confiança, ele e você passaram por muitas situações de aflição, romance, alegrias, etc, nenhuma dessas pessoas citaram esta boa relação com o sofá.

Na entrevista do telejornal você choraria... Lembraria do coração que desenhou no sofá, daquele filme que viu com a esposa juntos e até de algumas manchas... Ah! As manchas... O sofá era da família, não tinha nome, mas era... Ainda tem que aturar um psicólogo falando no dia seguinte que você não abraçou sua esposa quando falava do sofá, quem diabos abraçaria a esposa quando o assunto é o sofá da sala? Não faz sentido nenhum isso!

Inexplicavelmente você comentou com o policial que viu o ladrão, a luz não estava acesa, agora está, não sabe explicar as espumas do sofá no interior do carro, jamais agrediu o sofá dentro do carro, como será que elas foram parar lá? Tinha fiapos do sofá na sua roupa, tinha pegadas sua na casa. Seu advogado é sensato, a pegada não prova nada, prova só que você andou na casa e a espuma não é determinante.

Um taxista veio dizer que um ano atrás que sua esposa reclamou do sofá, disse a ele que você passava o dia todo deitado e ela era mulher e tinha necessidades e termina o relato dizendo que ela "ia dar um jeito".

Outro vizinho disse que um dia você um dia ficou puto e quebrou o vidro da janela. Mas a droga do seu time tinha perdido, o que você faria? Quebrar a estação do metro sozinho não dá.

E que diabos seria aquele aglomerado de pessoas em volta de sua casa? Você já disse que não foi você que jogou o sofá. "Existem leis regulamentares nesse país", não se pode fazer um pré-julgamento, jogaram pedras na minha casa, é preciso cautela, você diz a si mesmo que não é doido o suficiente para enfrentar a multidão, melhor ignorá-los, duvido que eles agüentem ficar lá por muito tempo.

Infelizmente só estamos comentando sobre isso até hoje, emocionados, porque não foi um sofá, nem um cachorro, foi um ser humano, indefeso. E enquanto os advogados continuarem com as loucuras do "pára, pai!" e "não ligaram pra emergência porque o vizinho que eles não conheciam já haviam ligado", ou ainda, "estão usando provas que não são legalmente válidas", continuaremos a debater não sobre o crime bárbaro que ocorreu, mas sim o óbvio que a era de informação criou e a grande massa, do olho por olho, quer resolver. No caso da Isabella, me interesso muito, não pelo fato em si, acredito que a própria era da informação e a liberdade de imprensa resolverá esse caso para nós, assistiremos dois especiais sobre o assunto, um globo repórter e na retrospectiva de 2008, mas me interessa ver a reação dos populares, das pessoas que não conseguem digerir a informação. Essas coisas me fazem lembrar da relação pacífica entre ignorância e felicidade e da fragilidade da nova era.

E para variar, eu não estou culpando ninguém, afinal, foi só um sofá que caiu 20 metros e ninguém liga pra isso mesmo, tomara que a polícia pegue o terceiro elemento, pois sem ele, nada faz sentido e as vezes eu mesmo me pergunto que sentido faria se este elemento aparecesse. Você promete sentado no sofá no jardim que pegaria o assassino do seu cachorro. Ele morreu senil e doente alguns anos atrás. Alguém lhe deu um espelho... Vai entender...

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Leis da Morcegação


Alguns anos atrás recebi um e-mail que ensinava sobre como morcegar no trabalho sem ser pego. Eu não lembro muito bem do e-mail, mas eu estabeleci alguns parametros de morcegação. Eu definiria morcegar como a metáfora de sugar o que for possível da empresa para dormir enquanto os demais trabalham, como o morcego que dorme durante o dia e suga sangue.


Antes de me julgar incorretamente, deixe-me justificar. Já ouviu aquele ditado que quem está de fora tem outra visão sobre os problemas? Eu considero o ato de morcegar uma forma de espairecer sobre os problemas e tirar um pouco da carga de trabalho para poder avaliar melhores soluções para eventuais problemas ou dilemas. Além de ser uma boa forma de esquecer um pouco do trabalho e relacionar um pouco com os colegas e ser lembrado por eles. Sem contar que todos temos problemas, de trabalho ou pessoais, e não dá pra simplesmente deixar eles pra lá. Estes pequenos atos eventualmente esquecidos pelos setores de RH que na média final acabam aumentando a produtividade de alguma forma é o objetivo final sobre o que escrevo agora.


Eventualmente sou criticado por parar o serviço para morcegar, nenhuma chefia gosta de ver o funcionário sem fazer nada, do ponto de vista gerencial quando se depara com um funcionário a toa é hora de passar novas tarefas ou cobrar algumas antigas. Portanto as técnicas aqui são para se esquivar disso, afinal, se você parou um pouco o serviço e porque você quer que ele assim permaneça. É claro que isso pode ser usado para o mal, os preguiçosos de plantão podem se beneficiar dos mesmos mecanismos para literalmente morcegar.


Primeiro, sempre que for andar por aí leve papeis com você. Acredito que exista até algo cientificamente comprovado que se você está carregando um jornal é porque está indo ao banheiro ou está procurando emprego. Se não leva nada, está a toa. Se você carrega papéis sempre dá a impressão que está fazendo algo.


Se for morcegar na própria mesa de trabalho, olhe para o monitor. Quem está olhando para o monitor não está a toa, mesmo se estiver. Aproveite e desenvolva técnicas de mexer o mouse enquanto dorme, eu já vi pessoas fazerem isso.


Se sua empresa tem mais de um prédio, use a técnica do "estou no outro prédio". Diga no prédio A que está no prédio B e no prédio B que está no prédio A. Até que você seja encontrado teve tempo suficiente de seu merecido descanso.


Sabe aqueles passatempos de caça-palavras, sudoku, etc? Já existem na internet, procure-os e use-os com sabedoria para não ser pego nos logs de acesso. Pelo menos dá menos na cara do que ser pego fazendo caça-palavras na mesa.


Responda e-mails sem resposta. Use o gerundismo e as respostas padrão para todos aqueles e-mails que não precisam de nenhuma resposta. Você não precisa pensar e enquanto morcega pode ficar respondendo aqueles e-mails com "ok", "muito obrigado", "estamos providenciando solução, aguarde". São respostas pequenas que nem precisariam ser enviadas, mas que lhe dão bastante tempo para você, enquanto as responde, faça aquela pesquisa no google que você estava sem tempo ou pense em na vida.


Faça amizade com um fumante. Os fumantes param algumas vezes durante o dia para fumar, ficam em áreas abertas depois das leis anti-tabagismo, e quase sempre são os lugares mais pacíficos e interessantes da empresa. Você não precisa fumar, mas pode acompanhá-los para bater um papo sobre alguma coisa ou só desabafar, cada saída deles dará 5 a 10 minutos de pausa no seu trabalho.


Participe das ginasticas laborais. Se sua empresa tem algum plano nesse sentido, participe. Quem trabalha muito com computadores sempre acaba desenvolvendo uma L.E.R. ou tem problemas de visão. Então deixe de sedentarismo e use os 15 minutos ou mais que normalmente estes eventos tomam. Pense positivo, são 15 minutos a menos de trabalho.


Tome café em outra sala e vá a passos lentos. Dê uma desculpa que o café do outro prédio/andar/sala é melhor que o que é servido na sua e vá até lá várias vezes por dia para pegar café.


Existem várias outras diversas técnicas de morcegação, não confunda o ato de morcegar com atos para disfarçar sua incopetência, mas você pode desprender algum tempo tentando convencer as pessoas que você está muito atarefado e sempre que alguém lhe passar alguma coisa você responde com um "vou tentar encaixar nas minhas pendências" mesmo que não esteja fazendo nada. Ou algum "vai demorar um pouco por causa das outras tarefas". Se a situação permitir use o famoso "vou deixar pra semana que vem porque estou muito ocupado esta semana".


Use as multiplas chefias a seu favor. Existe o problema que muitas empresas possuem muitos gerentes, diretores, coordenadores para poucos funcionários. Seria como um exército com 1000 generais e 1 soldado. Isso pode ser incrivelmente frustrante, mas pode ser usado a seu favor, se você descobrir como colocar os chefes para discutirem entre si, enquanto você se livra de grande parte de suas atribuições. Cuidado para não deixar o ambiente de trabalho carregado ao fazer isso.


Enfim, com essas técnicas você consegue morcegar durante alguns momentos do dia. Mas se estes pequenos atos não estão lhe ajudando a tornar seu ambiente de trabalho mais agradável ou estão lhe prejudicando de alguma forma, sugiro então não fazê-los, ou é melhor procurar outro emprego...